Silenciosas e fatais
- praticajornalistic
- 6 de jun. de 2023
- 6 min de leitura
Atualizado: 12 de jun. de 2023
Doenças crônicas não transmissíveis são responsáveis por 75% das mortes no Brasil, ultrapassando as notificações de óbitos causados por infecções
Por Maria Eduarda Salles
Você provavelmente conhece alguém que recebeu um diagnóstico positivo para alguma doença crônica não transmissível, as chamadas DCNTs. Porém, você já se perguntou como essas enfermidades podem afetar o estilo de vida das pessoas? As doenças crônicas tendem a surgir quando deixamos a saúde em “segundo plano”. Elas não têm uma causa única e, geralmente, são consequência de algum dano no organismo em desenvolvimento gradual, podendo ser silenciosas ou sintomáticas. Depois de diagnosticada, na maioria dos casos, será tratada por toda vida.
Entre as principais doenças crônicas não transmissíveis estão as respiratórias crônicas (bronquite, asma e rinite, por exemplo), as cardiovasculares, hipertensão, câncer, osteoporose, Parkinson, derrame cerebral, diabetes, obesidade e dislipidemia.

DCNTs simbolizam um grande desafio para a saúde pública, tanto pela alta incidência de casos quanto pela velocidade com que se tornaram as principais causas de morte no Brasil e no mundo. Crédito: Pixabay
De acordo com um estudo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as doenças crônicas não transmissíveis devem ser consideradas o maior problema de saúde pública no Brasil, pois reduzem a qualidade de vida dos diagnosticados e podem causar a sua morte prematura. O IBGE divulgou o levantamento feito pela Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) de 2019, constatando que 52% dos brasileiros com 18 anos ou mais foram diagnosticados com, pelo menos, uma doença crônica não transmissível.
Sob responsabilidade do Ministério da Saúde (MS), o Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel) monitora, anualmente, a frequência e a distribuição dos principais fatores de risco e proteção associados às doenças crônicas não transmissíveis em todo o Brasil. As enfermidades predominantes são a hipertensão, o diabetes, a depressão e a asma. Apesar de as mulheres serem as principais afetadas pelas DCNTs, sobretudo as acima de 65 anos, o MS alerta que a população masculina adota poucos cuidados preventivos. Segundo o levantamento, 31% dos monitorados não têm o hábito de ir ao médico.
O policial rodoviário aposentado, Creso Carlos, 71 anos, é um desses casos que só começou a fazer exames regularmente após o diagnóstico positivo. Há 15 anos, ele descobriu que é diabético e hipertenso e isso lhe causou apreensão porque ele estava apenas fazendo exames de rotina e não esperava que sua vida mudaria completamente. Ele só conseguia pensar que teria que mudar alguns hábitos e cuidar melhor da alimentação, além de incluir o uso de medicamentos para o tratamento e bem-estar. “No início levei um susto, mudei bastante a minha rotina alimentar e, frequentemente, faço caminhada e pilates. Uso medicamentos que recebo do SUS e compro o restante que não é oferecido. No total são seis remédios diários”, descreve. Além disso, ele verifica a pressão e o índice glicêmico todos os dias. Quando percebe uma alteração, o aposentado controla a alimentação e toma mais um medicamento prescrito.

O aposentado Creso Carlos confessa que não cuidava da saúde, mas isso mudou após os
diagnósticos positivos para doenças crônicas não transmissíveis. Crédito: arquivo pessoal
Há casos como o de Creso que o diagnóstico vem em decorrência de maus hábitos alimentares e descuido com a saúde. Em outros, não estão relacionados à falta de cuidados, mas sim à predisposição. O pré-diabetes, por exemplo, é quando existe um problema com a forma do corpo lidar com os níveis de glicose no sangue, que não são altos o suficiente para serem considerados como diabetes. Essa disfunção é um sinal de alerta crítico em crianças com risco de desenvolver a doença. Esse é o quadro clínico da estudante, Maria Eduarda Delgadinho, 21 anos. Quando tinha apenas oito anos, Duda recebeu diagnóstico positivo para diabetes tipo 1 e, desde então, faz o uso de bomba de insulina e de sensor de glicose, ambos fornecidos pelo SUS. “Por mais que minha mãe me levasse ao médico para fazer os exames de rotina, nenhum tinha pedido o exame de glicemia. Então, até alguém pedir, eu já tinha desmaiado na escada da escola. Eu fui a vários outros médicos, até médico particular, mesmo sem ter condições. Uma das respostas do médico foi que eu estava louca, com mania de doença e que eu não tinha nada”, desabafa.
Duda detalha sobre o seu processo de descoberta de diagnóstico para o diabetes. Crédito: arquivo pessoal
Compromisso mundial
Em função da gravidade das doenças crônicas não transmissíveis e os impactos no sistema de saúde, a Organização das Nações Unidas (ONU) convocou, em setembro de 2011, uma reunião de alto nível com o intuito de debater compromissos globais sobre o tema. O encontro resultou em uma declaração política na qual os países-membros se comprometiam a evitar o crescimento das DCNTs por meio de ações de prevenção em prol da saúde.
O Ministério da Saúde e a Secretaria de Vigilância em Saúde apresentaram, durante a Semana das Doenças Crônicas Não Transmissíveis, em 2021, o cenário brasileiro em relação à essas doenças, o que originou o lançamento do “Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas e Agravos Não Transmissíveis (DCNT) no Brasil, 2021-2030”. O documento define 23 metas e 226 ações estratégicas para capacitar o país a responder aos desafios de ser acometido por essas doenças, assim como atualiza e renova o compromisso do Governo Federal em reduzir a mortalidade por doenças crônicas não transmissíveis no período de uma década.
As DCNTs são agrupadas em duas categorias: congênitas, quando a pessoa já nasce com elas ou que surgem nos primeiros meses de vida, e não congênitas ou infecciosas, causadas por organismos invasores, em qualquer fase da vida.

Arte: Maria Eduarda Salles
Geralmente, a obtenção das DCNTs é o resultado de diversos fatores, sendo eles genéticos, ambientais, fisiológicos e comportamentais, variando de acordo com o estilo de vida da pessoa. A falta de atividades físicas e da ingestão de nutrientes potencializam um sistema imunológico mais fraco e, consequentemente, mais propenso a essas doenças.
Diabetes Mellitus
É uma condição crônica e hormonal que ocorre devido à elevação da glicose no sangue (hipoglicemia). Os sintomas podem ser sede e fome demasiadas, visão embaçada, formigamento excessivo nos pés, infecções e dificuldade na cicatrização de feridas.

O tratamento inclui uso diário do aparelho glicosímetro, realização do exame da hemoglobina glicada (A1C), controle de colesterol e triglicérides e alimentação balanceada. Créditos: Pixabay
Doenças Cardiovasculares
Esses tipos de doenças tendem a afetar, principalmente, homens acima dos 50 anos e costumam não apresentar sintomas evidentes. Os tratamentos podem ser feitos com agentes betabloqueadores, diuréticos, digitálicos e inibidores da enzima conversora de angiotensina.

Ataques cardíacos e acidentes vasculares cerebrais são eventos agudos causados, principalmente, por um bloqueio que impede que o sangue flua para o coração ou para o cérebro. A razão mais comum para isso é o acúmulo de gordura nas paredes internas dos vasos sanguíneos. Créditos: Pexels
Câncer
É causado pelo crescimento desordenado de células que invadem tecidos e órgãos, que se dividem rapidamente e tendem a ser agressivas e incontroláveis, estabelecendo a formação de tumores que podem se alastrar por outras regiões do corpo. Os sintomas se manifestam de várias formas, desde caroços até mudanças de hábitos fisiológicos e perda de peso sem evidência.

Os tipos de câncer com maior incidência no Brasil são os de traqueia, brônquio, pulmão, cólon e reto, mama, estômago, próstata, fígado, pâncreas e esôfago. Créditos: Pexels
Hipertensão
É identificada pelos níveis elevados da pressão sanguínea nas artérias. Os sintomas podem ser dores de cabeça e no peito, tontura, fraqueza e sangramento nasal. A aferição regular da pressão serve para detectar a doença, que não tem cura e requer mudanças nos hábitos para uma vida mais saudável.

A hipertensão é uma doença crônica que tem múltiplas causas, como a genética, o sedentarismo, o consumo excessivo de sal, a obesidade, o consumo excessivo de álcool, o diabetes e o tabagismo. Créditos: Pexels
Prevenção e tratamentos
As doenças crônicas não transmissíveis disseminam-se em grande parte da população, porém é possível evitar muitas delas com acompanhamentos médicos regulares. É essencial fazer um check-up anualmente, especialmente após os 50 anos.
A médica endocrinologista, Rosane Nassar, conta que as doenças crônicas não transmissíveis tiveram um aumento recente, principalmente nos anos de 2021 e 2022, relacionados com a pandemia de Covid-19. Entre os principais fatores estão o sedentarismo e a obesidade. “O tratamento dessas patologias envolve um tripé: mudança no estilo de vida que correlaciona com alimentação mais saudável, atividade física e o uso de medicamentos. Hoje, temos o tratamento gratuito pela rede básica do SUS e fornecido pelas farmácias populares. Os medicamentos básicos conseguem atingir boa parte do tratamento da maioria dos pacientes”, alerta a médica. Crédito: arquivo pessoal.




Comentários