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Multiplicação da dengue

  • praticajornalistic
  • 3 de jun. de 2024
  • 7 min de leitura

Atualizado: 4 de jun. de 2024

Aumento drástico no número de casos da doença preocupa; só nos quatro primeiros meses de 2024 houve mais contágios do que em todo o ano de 2023


Texto: Amanda Lorenzi

Edição: Ariane Lemos

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Mosquito Aedes aegypti, transmissor do vírus da dengue. Crédito: Freepik


“Parecia que tinha passado um caminhão por cima de mim”. É dessa forma que a aposentada Maria Aparecida Souza da Silva, 62 anos, descreve como se sentiu ao contrair dengue. Cida, como prefere ser chamada, faz parte de uma preocupante estatística relacionada ao aumento radical no número de casos de dengue, em 2024.

 

Apenas nos quatro primeiros meses de 2024, o Brasil chegou a registrar 5.408.336 de casos prováveis e 5.036 mortes por dengue, superando os números contabilizados em todo o ano de 2023, quando foram registradas 1.649.144 de casos prováveis e 1.179 mortes por dengue.

 

De acordo com os dados fornecidos pela plataforma de monitoramento de arboviroses do Ministério da Saúde, São Paulo é um dos estados com mais registros da doença. Segundo dados do Centro de Vigilância Epidemiológica do Estado de São Paulo, pelo menos, sete das 15 mortes confirmadas por dengue, em janeiro deste ano, ocorreram no estado paulista.


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Cida, diagnosticada com dengue duas vezes, teve sintomas entre febre, dores no corpo e falta de apetite. Crédito: Arquivo pessoal


Cida é moradora do município de Guarulhos, São Paulo, e já contraiu dengue duas vezes. Ela se descreve como sendo uma pessoa “muito difícil de ficar doente”, mas que na primeira vez que teve a doença, em 2022, não tinha força para fazer nada.

 

“Logo no primeiro dia, comecei a ficar ruim, tive muita febre e senti muito frio, mesmo sendo um dia de calorão. No outro dia, eu já não conseguia levantar, doía o corpo todo, não conseguia comer nada, apenas me hidratar com água e suco. Fui ao médico e fiz todos os exames possíveis para descobrir o que era, mas somente depois do sexto dia, quando fui a um médico diferente, chegou-se ao diagnóstico de dengue e pude me tratar certinho”, relata.

 

Na segunda vez que teve dengue, neste ano, Cida novamente ficou muito mal. “Tive febre dessa vez também, mas o que mais me deixou ruim foi a falta de apetite. Fiquei quase três semanas sem conseguir comer nada, sem colocar nada na boca, apenas água, de tanto amargor. Ainda assim, sinto que foi um pouco mais leve do que anteriormente”, compara.

 

Mesmo medicada, meses depois de ter ficado doente, Cida admite que ainda não se sente completamente recuperada já que apresenta sequelas, como fraqueza constante nas pernas e manchas vermelhas. Ela completa dizendo que, das duas vezes que apresentou a doença, não é capaz de afirmar onde pode ter contraído a dengue, pois sempre cuida e limpa tudo em sua casa para não ter lugares para reprodução do mosquito transmissor da doença.

 

Recorde de casos

 

São Paulo, onde Cida mora, e o Distrito Federal estão na lista dos locais onde há mais casos de dengue. Na sequência outros oito estados estão entre os mais infectados: Amapá, Amazonas, Bahia, Goiás, Minas Gerais, Pará, Pernambuco, Rio de Janeiro e Roraima. Segundo os dados da plataforma de monitoramento do Ministério da Saúde, até o mês de abril de 2024, o estado mineiro apresenta o maior número de casos, chegando a 676.758. Durante todo o ano de 2023, Minas Gerais teve 408.393 infecções.

 

Ainda conforme dados do painel, tendo como base o coeficiente de incidência para cada 100 mil habitantes, o Distrito Federal assume o primeiro lugar, com 5.725,8 casos para cada 100 mil habitantes. Até abril corrente, foram registrados 161.299 casos, quase quatro vezes mais do que os casos confirmados em todo o ano de 2023, quando chegou-se à marca de 38.584 registros.

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Ao todo, o Brasil já ultrapassou a marca de 2 milhões de casos este ano (são 2.416.603 no total), 1.937 pessoas morreram em decorrência da doença, e outros 805 óbitos estão em investigação pelo Ministério da Saúde.

 

Por que esse aumento?


A dengue ocorre em climas tropicais e subtropicais e, de acordo com o Ministério da Saúde, a combinação do calor extremo e chuvas intensas (possíveis efeitos do El Niño) contribuem para o aumento de casos da doença. O ressurgimento dos sorotipos 3 e 4 do vírus da dengue no Brasil também explicam os recordes de casos.

 

Para o infectologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz e autor do livro "A história das epidemias", Stefan Cunha Ujvari, é normal ocorrer epidemias de dengue de tempos em tempos. Em entrevista ao podcast "O Assunto”, o infectologista ressalta que: “A epidemia depende de vários fatores, como o aumento de temperatura, que favorece a proliferação do mosquito, um período de chuvas intensas, que aparece principalmente nos períodos de El Niño e, por isso, a gente pode ter nossas epidemias de dengue. Já temos quatro tipos de vírus da dengue circulando no Brasil”.



A partir de dados do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), a previsão climática para o país entre os meses de abril e junho indicou grande probabilidade de chuva abaixo da faixa normal entre o centro, norte e leste do Brasil. Em parte da região Sul, de Mato Grosso do Sul, São Paulo e uma pequena área de Minas Gerais, Roraima e Amazonas, a previsão indicou maior probabilidade de chuva acima da faixa normal, justamente nas áreas onde houve aumento de casos de dengue e que enfrentam dificuldades para controlá-la.

 

A combinação entre mudanças climáticas, urbanização, acúmulo de resíduos e falta de saneamento básico contribuíram para a proliferação dos mosquitos vetores e aumento de casos de dengue em 2024. Além disso, o aquecimento global está facilitando para que a doença chegue a locais do Hemisfério Norte acima da linha do Equador, em regiões de clima mais ameno, como nos Estados Unidos e países europeus. Nessas regiões, o Aedes albopictus, da mesma família do Aedes aegypti, também tem se reproduzido e se tornado uma fonte de transmissão de dengue, Zika e Chikungunya.

 

O que é dengue?


A dengue é uma doença viral transmitida pela picada da fêmea do mosquito Aedes aegypti. É considerada como uma arbovirose por ser transmitida por vetores artrópodes.

 

Os vírus da dengue (DENV) estão classificados cientificamente na família Flaviviridae e no gênero Flavivirus. Até o momento, são conhecidos quatro sorotipos – DENV-1, DENV-2, DENV-3 e DENV-4 –, que apresentam distintos materiais genéticos (genótipos) e linhagens.

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Pessoas de todas as faixas etárias são suscetíveis à doença, porém as idosas e doentes crônicos, como diabéticos e hipertensos, têm maior risco de evoluir para casos graves e outras complicações que podem levar à morte. Os principais sintomas provocados pela dengue são febre alta, dor no corpo e articulações, dor atrás dos olhos, mal-estar, falta de apetite, dor de cabeça e manchas vermelhas no corpo. 

 

Pessoas infectadas com o vírus mais de uma vez têm um risco maior de desenvolver a doença mais gravemente, condicionando a dengue hemorrágica. Esta é a forma mais perigosa da doença por causar grandes perdas de sangue e choque hemorrágico (quando uma pessoa perde mais de 20% do sangue ou fluido corporal), o que pode ser fatal.

 

Ao apresentar os sintomas, é importante procurar um serviço de saúde para diagnóstico e tratamento, que inclui ingestão de líquidos e analgésicos. A enfermeira Andréa Regina Lima Vetorazzo esclarece que há um protocolo para identificar se o paciente está com dengue ou algum outro tipo de doença.

 

“Não está tendo somente um surto de dengue, também estamos enfrentando crises de covid e Chikungunya. Pelos sintomas serem muitas vezes parecidos, existe um protocolo no qual o paciente precisa apresentar dois ou mais sintomas para o diagnóstico”, explica a enfermeira acrescentando que é, a partir do sexto dia, que a coleta de sangue é feita para o exame aponta reagente ou não reagente para o vírus da dengue. A profissional da saúde ressalta a importância de se buscar atendimento adequado em casos de suspeita de dengue.

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Andréa conta que as unidades básicas de saúde estão trabalhando com sistemas de agendamentos de consultas e emergência para todos os casos de suspeitas de dengue, assim como as unidades de pronto atendimento. Crédito: Acervo pessoal.


O analista de suporte técnico automotivo, Marlon de Oliveira Geraldo, 29 anos, morador da capital paulista, seguiu exatamente essa orientação. Ao persistirem os sintomas de dor de cabeça e nas costas, procurou atendimento médico. “Ao chegar em casa do trabalho fiz a medição da temperatura e estava febril com 37,5, tomei um Paracetamol por prevenção, mas não surtiu efeito. Acordei muito mal no outro dia, a dor no corpo tinha piorado e a febre estava mais alta, não conseguia comer e apresentei muita dificuldade para andar. Fui ao médico que concluiu que era dengue, então fui devidamente medicado”, conta.

 

Marlon ainda relata que mesmo tomando os remédios prescritos, não melhorou prontamente como o previsto. “O médico me deu quatro dias de atestado, porém ao passar dos dias os sintomas não acabaram e ainda apresentei vômitos com presença de uma pequena secreção. Retornei ao médico e fiz os exames das plaquetas, que não estavam (no nível) ideais, então o médico me orientou a me hidratar bastante e comer alimentos ricos em ferro para auxiliar na melhora do quadro. Após ficar mais quatro dias em casa, consegui me restabelecer”, descreve.

 

Cida e Marlon, além de lidarem com os sintomas da dengue, temiam a evolução da doença para quadros mais graves, que provocam sérios riscos ao corpo e sistema imunológico. Nesses casos, o atendimento médico deve ser priorizado e a automedicação evitada.

 

As principais formas para se prevenir da dengue são a vacinação contra a dengue e o controle do vetor Aedes aegypti, sendo este último o mais importante método para prevenção e combate. O cuidado com os ambientes doméstico e de trabalho também deve estar em dia, mantendo os espaços limpos e protegidos do acúmulo de água.

 

Você sabia?

 

A médica clínica-geral, Isabella Venturim Souto, tira-dúvidas sobre a dengue. Confira!

 

Por que a doença causa tanta dor? É uma resposta inflamatória da doença. O vírus aciona o sistema imune do ser humano, provocando um quadro inflamatório que é o que causa dor.

 

O que acontece para desenvolvermos dengue hemorrágica? É uma resposta inflamatória exacerbada ao vírus. Ocorre o aumento abrupto de permeabilidade vascular, o que leva ao extravasamento do plasma para o espaço extravascular, que resulta em: hemoconcentração e diminuição da pressão sanguínea.

 

Tem como reconhecer se está ficando com dengue hemorrágica? Sim, existem sinais de alarme, dentre eles: dor abdominal, derrames cavitários, sangramento de mucosa e aumento progressivo de hematócrito.

 

É normal quando estamos no estágio final da doença sentir coceiras pelo corpo? Normal não é porque se trata de uma doença/infecção. A coceira é racional para a doença em questão, então, quando ela passa, o prurido deveria passar também. Estudos relatam que ele é autolimitado, durando cerca de 36h a 48h.

 

É verdade que no inverno não tem dengue? Não necessariamente, a quantidade de casos apenas diminui bastante pela taxa de reprodução do mosquito também diminuir.

 

Existe algum repelente próprio para se prevenir da dengue? Sim, para adultos, a Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) e a Anvisa recomendam que, para ser efetivo contra o mosquito da dengue, o repelente deve conter uma das seguintes substâncias: Icaridina, DEET e IR3535. E para as crianças as recomendações seguem a da Sociedade Brasileira de Pediatria.

 

 
 
 

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